A história que relato a seguir é verídica, portanto não citarei nomes reais, preservando a privacidade de seus verdadeiros personagens.
Um amigo psicólogo iniciou, há alguns anos atrás, atendimento a um menino de seis anos que era rejeitado por sua mãe, que chamarei de Nate.
Toda vez que Nate entrava no consultório para falar sobre seu filho, comentava a meu amigo que deveria ter dado o menino, logo que nasceu, pois não suportava a presença dele e que tudo que ele fazia deixava-a muito irritada.
Meu amigo psicólogo, a quem chamarei de Leandro, estava preocupado com o comportamento do menino, que era muito quieto e tinha pouco interesse por brinquedos.
Durante as sessões de terapia, Leandro procurava divertir o menino com desenhos e brinquedos, conseguindo alguns sorrisos do inocente rejeitado pela mãe.
Mesmo parecendo estar convicta do que dizia sobre o filho, Leandro não estava convencido que aquela rejeição era um desejo real da mãe.
Certo dia, pouco antes de Nate chegar ao consultório para um atendimento, a fim de tratarem sobre a terapia do menino, Leandro recebia a visita de sua prima. Enquanto conversavam, ele teve um insight e pediu para sua prima participar da sessão que faria a seguir com Nate.
Disse à prima que ela deveria apenas se apresentar como assistente social e depois ficar em silêncio, apenas concordando com tudo que ele iria dizer.
A prima de Leandro ficou confusa e com receio da representação que teria que fazer. Ele insistiu, sem explicar. Ela aceitou, mesmo sem entender muito bem a razão.
Assim que a mãe do menino chegou, Leandro pediu que ela se sentasse para iniciarem a conversa. Logo que se acomodou em uma poltrona, perguntou o que aquela outra mulher fazia na sala e por que estava na sessão.
Leandro pediu desculpas por não ter avisado antes e explicou que se tratava de uma assistente social que iria participar da sessão. A mãe do menino ficou furiosa e disse que não queria a participação de uma assistente social e que não havia nenhuma razão para ela estar ali.
Leandro salientou que a assistente social estava ali para ajudar a encaminhar os papeis de adoção para seu filho, já que ela não suportava conviver com o menino.
Nate ficou enlouquecida e saiu da sala gritando que ninguém iria adotar seu filho e que Leandro era um louco varrido. Gritava que seu filho era seu problema e que ninguém iria dizer o que ela deveria fazer.
Houve uma quebra de estado. O consultório sempre foi o local em que a mãe podia dizer o que queria, mas jamais esperava que sua perspectiva fosse desviada.
O filho era o alvo para descarregar sua raiva e poder justificar sua sensação de vida infeliz. Só não esperava que alguém pudesse tirá-lo dela. Não havia imaginado a perda e o que isso causaria em sua mente e suas emoções.
Conscientemente estavam presentes valores distorcidos sobre seus reais sentimentos em relação ao filho.
Umas duas semanas depois, Nate apareceu com seu filho no consultório de Leandro. Disse a ele que o menino era a coisa mais preciosa que existia em sua vida e que agora ela entendia isso.
Que não suportaria a possibilidade de perdê-lo. Que ele não tinha pai e que Leandro era a única referência masculina com quem o menino se sentia bem. Que Leandro era a pessoa em quem ela sabia que podia confiar, porque dava atenção a seu filho, contribuindo para que o menino ficasse mais à vontade e alegre, o que não era comum acontecer quando estava com outras pessoas.
Também argumentou que se ela sofresse alguma coisa, Leandro não deixaria de cuidar do seu filho. E isso também a deixava segura.
O menino já está com dez anos, sem falhar nenhuma sessão semanal com Leandro. Criou-se um lindo vínculo de amizade entre psicólogo e cliente.
Leandro conta que seu consultório parece um centro de recreação, com brinquedos, lápis de cor e desenhos espalhados por toda sala. Essa relação demonstra que Leandro está suprindo um espaço importante de referência masculina, numa relação de confiança entre psicólogo, cliente e mãe do cliente.
Virou uma verdadeira história de amizade e confiança. É importante relatar também que Leandro nunca havia cobrado qualquer valor, desde o início da terapia, pois o menino, filho de Nate, é um dos casos em que Leandro faz atendimento gratuito.
A quebra de estado com inversão de cenário é uma ferramenta eficiente se bem administrada. Nesse caso, relatado na história de Leandro, fica evidente que a ação causou um profundo impacto de percepção de valores.
Não é incomum o ser humano manter certos valores distorcidos. Isso também se associa às crenças presas em modelos mentais herdados do ambiente ou criadas como fuga da realidade.
Alguns desses modelos podem se tornar travas poderosas que impedem a pessoa de perceber ou aceitar além da sua realidade de valores, prendendo-se a uma realidade própria inventada. Eu diria que Leandro deu à Nate o que ela precisava e não o que ela queria.
Por isso, Nate se deparou com uma situação que não havia considerado antes, tendo a oportunidade de avaliar um novo cenário com novos sentimentos. Assim, essa nova experiência a fez perceber valores significativos que antes não eram considerados e tão pouco relevantes.
A mudança de perspectiva lhe ajudou a identificar outros pontos de vista e a reavaliar seus modelos mentais em relação ao seu filho.
Essa nova perspectiva só pôde ser percebida e aceita porque houve uma sensação de perda inesperada. Ela se sentia confortável ao culpar seu filho por sua infelicidade, mas nunca havia parado para pensar se realmente se sentiria mais infeliz sem ele.
Ao acordar para uma nova visão sobre sua relação com o menino, provocada pela mudança de estado com a representação da tal assistente social, Nate ficou chocada e teve que repensar seus valores e, consequentemente, isso também provocou mudanças em seus modelos mentais, aflorando suas necessidades e responsabilidades de mãe.
Percebeu que o amor por seu filho era maior e mais importante que sua imaginada infelicidade. Mas, na verdade, a felicidade real de Nate estava o tempo todo em seus braços e ela nem percebia ou simplesmente não queria reconhecer.
O exemplo de Nate não é isolado. Mudanças nem sempre são confortáveis. Sim, para alguns é mais confortável apontar culpados, doa o que doer nos outros, do que assumir responsabilidades por seus atos.
Alguns modelos mentais são limitadores graves, que impedem as experiências realmente positivas.
Com concentração e prática é possível encontrar felicidade em muitas coisas que podem parecer desinteressantes. Sempre vale a pena arriscar novas perspectivas sem medo de ser feliz.
Realmente reconhecer através de uma ferramenta ou processo psicológico que a resposta sempre está dentro da gente ou a resposta certa é algo que negamos o tempo todo é gratificante para o resto da vida. Missão de coach cumprida.